O presente é o instante em que a roda do automóvel em alta velocidade toca minimamente no chão. E a parte da roda que ainda não tocou, tocará em um imediato que absorve o instante presente e torna-o passado.
Mais que um instante, quero seu fluxo. Nova era, esta minha, e ela me anuncia para já. Tenho coragem? Por enquanto estou tendo. Venho do longe - de uma pesada ancestralidade. Eu, que venho da dor de viver. E não a quero mais. Quero a vibração do alegre. Mas quero também a inconsequência. Liberdade? É o meu último refúgio, forcei-me à liberdade e aguento-a não como um dom, mas com heroísmo: sou heroicamente livre. E quero o fluxo.
Estou à salvo? Enxugo a testa molhada. Ergo-me devagar, tento dar os primeiros passos de uma convalescença fraca. Estou conseguindo me equilibrar.
Estou à salvo? Enxugo a testa molhada. Ergo-me devagar, tento dar os primeiros passos de uma convalescença fraca. Estou conseguindo me equilibrar.
Não, isto tudo não acontece em fatos reais, mas sim no domínio de - de uma arte? Sim, de um artifício por meio do qual surge uma realidade delicadíssima que passa a existir em mim: a transfiguração me aconteceu.
Trecho e adaptação de "Água viva" - Clarice Lispector.
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