"Não basta dizer que se é consciente de algo; é-se, também, consciente de algo como sendo algo"



quinta-feira, 15 de abril de 2010

..:: Notícias populares II ::..


Nas minhas caminhadas e leituras, tive acesso a um texto que caracteriza de maneira efetiva o que tentei retratar no texto "Notícias populares". Pois bem, abaixo seguem os escritos que foram encontrados originalmente no blog da filósofa Marcia Tiburi. Inicialmente ela faz um comentário sobre o texto e em seguida ele finalmente é apresentado.

"Ceres Almeida é psicóloga e frequenta a oficina de escrita criativa que tenho junto com o Evandro Affonso Ferreira. Ontem, a propósito de um exercício envolvendo o autor Giorgio Manganelli, ela nos trouxe este texto que, a meu ver, é uma visão radiografada do evento da morte de Glauco que perturba a nós todos. Quem curtia a arte de suas tiras e charges ficou mal, quem não sabia que ele era um artista bacaníssimo também ficou triste demais, afinal era um homem de bem tentando melhorar o mundo em que vivia. Eu achei tão lúcido o que a Ceres escreveu; é como se ela tivesse percebido uma espécie de mito que estruturou o acontecimento infeliz de sua morte. Como psicóloga – e uma escritora de talento real – ela percebeu o lugar do assassino e sua dor que, nós mesmos, pessoas-aí, não podemos compreender nem com todo o esforço de nossas interpretações."


Eis o texto da Ceres:

O rapaz vestido com jeans, olho arregalado, arma na mão, precisa fazer anunciação à mãe, que é ele, seu filho, o próprio Jesus, que nasceu grande, barbudo, de Maria distante. Ninguém lhe diz quem é, só que não é quem pensa que é.  Quem é, pouco se sabe, pouco se sabe se faz milagres, se cura gente, se faz defunto levantar. Jesus das Travas e das Trevas busca três magos e estrela guia prá nascer grande na Santa Igreja do Céu de Maria. Proclama em voz alta Eu sou a Mentira, o Descaminho, a Morte, quem me perseguir, morrerá, nascendo se morre para a morte eterna, amém.  

De todos os magos da Santa Igreja, o primeiro lhe chegou como quem quer conversar, o segundo lhe chegou como quem quer brigar, o terceiro foi aquele que com ele compactuou. Fez milagre, meteu bala em dois magos, mostrou seu poder, Maria haveria de saber. Foi perseguido, preso e acusado e está sentado do lado esquerdo de deus pai, Juiz de direito, por quem há de ser julgado entre vivos e mortos. Em seu martírio, Judas-Jesus, o rapaz de jeans, profere solene sua oração. Mãe minha que estás não-sei-onde, beatificado seja seu filho, criador de céus e infernos, olhai por mim, o renegado, agora e na hora do meu julgamento. Aquém.

Segundo relato das testemunhas o rapaz de jeans estava transtornado e delirava. Ele estava armado com pistola automática e faca na mão. Um homem tentou negociar com ele e chegou a ser agredido. De acordo com alguns, este homem não reagiu. No meio da discussão, porém, o filho deste homem chegou ao local. Em seguida, o rapaz de jeans atirou contra pai e filho, mas os motivos ainda não foram esclarecidos. Os dois chegaram a ser atendidos no hospital, mas não resistiram e morreram. O rapaz de jeans sorri atrás das grades, em nome do Pai e Filho mortos, ele a Encarnação do Espírito Santo. Amém.

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